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A travessia

  • 8 de out. de 2020
  • 4 min de leitura

É engraçado como as coisas costumam acontecer. Nascemos, crescemos, morremos; cumprimos nosso aparente ciclo vital. Sem muitas explicações, tudo segue na mesma linha para todas as pessoas do mundo – e quase todos os seres vivos (existe uma espécie de água viva imortal).

Claro que dentro das minúcias do que é crescer, do que é nascer e do que é morrer se constroem as diferenças entre as vidas, mas no final das contas todo mundo seguiu o mesmo ciclo, de uma ou outra forma.

E a vida segue com novas vidas emergindo (ou ao menos novos corpos), sem que nós sejamos capazes de entender a mecânica principal, constantemente buscada hoje em dia, conhecida como propósito. Qual o propósito da vida?

Essa pergunta tem sido feita por filósofos desde que o mundo é mundo e hoje passou definitivamente para “a boca do povo”. Pessoas estão incomodadas por viver sem de fato conhecer seu verdadeiro propósito e essa busca, de alguma forma, tem sido o foco da vida de muitos.

Junto disso, muitas outras pessoas que se dizem alinhadas com forças especiais, saem por aí distribuindo propósitos, como se conseguissem delimitar, definir o destino alheio.

Ao mesmo tempo em que filósofos refletiam sobre seu propósito e o buscavam, temo que seja necessário reconhecer que a própria busca pelo propósito, que muitos morreram sem acreditar ter encontrado, foi o seu propósito.

Nosso propósito muitas vezes não pode ser reconhecido pelas ordinárias compreensões mundanas, muito menos linearmente delimitado por alguma frase ou ação. Um propósito real causa arrepios, nos atrai como a lua atrai o mar, causa uma sensação estranha dentro do peito, é algo nosso e apenas nosso. E se divide em propósitos.

Mesmo que de fato alguém consiga enxergar o propósito alheio, sua execução será limitada à interpretação da pessoa. O propósito pertence a cada um e inevitavelmente a gente acaba realizando ao menos parte dele.

Nos identificar, nos conhecer e discernir o que é nosso do que é do mundo, pode nos auxiliar a encontrar nosso propósito e caminhar nesse sentido. Quanto mais conscientes, mais nos inclinamos a realizar nosso propósito. Quanto menos conscientes, é inevitável que realizemos parte dele, mas podemos deixar algumas coisas como débitos a serem “cobrados” (na falta de uma palavra melhor...) futuramente.

Gosto de entender a vida pensando que, como um todo, seu propósito é a travessia de todos. Para onde? Para um lugar bom e melhor. No entanto precisamos todos chegar lá. A travessia é complicada, cheia de percalços. Às vezes tocamos o barco sozinhos, conseguimos ir longe, mas não dividimos com ninguém e afundamos. Outras vezes, nos sacrificamos logo de início, mas deixamos dicas e reforçamos outros barcos. Isso fica de herança.

Herança pra quem? Pra toda a humanidade, que segue na tentativa da travessia. A travessia é complicada e alguns poucos que conseguem fazê-la sempre voltam para nos ajudar. O problema é que os caminhos tomados não são lineares e nem sempre compreendemos o que precisávamos entender.

Dentro dessa louca travessia foi criada uma sociedade, formada primordialmente por pessoas desinteressadas na travessia, mas interessadas em se manter na liderança aqui mesmo, no meio do caminho. Seus interesses se tornam, portanto, manter um controle sobre as sombras que iludem as pessoas. Sim, é o mito da caverna de Platão.

Mas a própria batalha da resistência constitui uma ilusão e uma quebra de propósito. É como se escolhêssemos lutar contra a gripe ao invés de tornar nosso corpo um ambiente inóspito para ela. A própria batalha é um mecanismo – muito útil – de defesa da caverna. E nessa caverna fomos ficando, nos esquecendo da travessia.

Acontece que mesmo aqui ainda existe nosso propósito, mas tomando consciência da caverna, mesmo estando nela, conseguimos continuar nos guiando pela travessia, porque o caminho externo faz parte da ilusão. Este texto está se complicando, mas a realidade última já foi apresentada em outros: as virtudes.

Todo o resto é perecível e ninguém faz a travessia com o perecível, somente com o imperecível. Mas a nossa travessia não é completa com a morte. A morte simplesmente separa uma existência de outra, mas existe algo que precisamos alcançar para conseguir a travessia.

Da mesma maneira como uma borboleta pode chegar a muitos outros lugares onde a lagarta não pode, para conseguirmos completar a travessia é necessário alcançar um certo grau de maturidade, ou ficaremos presos na eterna travessia, que pode também ser chamada “roda de Samsara”.

Enquanto o foco for combater ao invés de se tornar, continuaremos a nos identificar com as debilidades. Ao nos identificarmos, as debilidades ganham força. A prática oposta é o que vence, não a lágrima pela falha. A ação supera qualquer reação a algo, e a ação deve ser guiada pelo bem e para o bem, esse é parte do objetivo.

O sopro de mercúrio é a inspiração mais antiga, capaz de romper o caos e trazer mesmo as almas mais perdidas de volta. Einstein, Michelangelo, dentre outros gênios da humanidade tentaram descrever esse sentimento intuitivo. Sintam no ar a mensagem de Deus, se deixem inspirar pelas virtudes, sigam o sopro de mercúrio para auxiliar na travessia.

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